Um ano inteiro

No último dia 24, a primeira coluna de tecnologia Expressão Digital foi postada, num projeto de trazer, semana após semana, informações e impressões acerca da nova cena mundial tecnológica (a coluna mais recente foi exatamente no dia 24, mas não tinha me dado conta da data, então vai hoje mesmo).

Por falta de assunto, não vai ter coluna hoje: vai ter só o profundo agradecimento aos leitores, aos companheiros de blogue e aos cliques no adsense que, por bem ou por mal, são o principal motivo das postagens (nem sempre) freqüentes por aqui.

O canhoto

Crescer é enfrentar a realidade. Descobrir que Papai Noel não existe, que ter barba não é exatamente algo prático e que as meninas não se interessam por bonecos dos Comandos em Ação. No entanto, certos momentos que vivenciamos quando crianças ainda mantém a mesma atmosfera impressionante e idealizada (leia-se “saudosismo”) – não é a toa que, a partir de certa idade, as pessoas querem rever os desenhos que assistiam quando eram mais jovens (e que foram abolidos do cotidiano adolescente por questões sociais).

Entre junho e julho de 1994, eu descobri que existia um país chamado Romênia (dêem um desconto, naquela época Google e Internet não existiam). E descobri graças à seleção romena, que na Copa do Mundo dos Estados Unidos construiu uma trajetória brilhante até as quartas-de-final, sendo eliminada pela Suécia nos penaltis.

Naquela época, o número dez definia não apenas a minha idade, mas também o craque de cada time: os setes, noves, onzes, por melhor que jogassem, eram coadjuvantes (Romário é a exceção que confirma a regra). E na Romênia, o jogador que carregava tal fardo o fazia como se fosse a coisa mais leve do mundo, um trabalho simples. Para ele, o dez era um estímulo, e não um peso.

A grande verdade é que cada toque que Gheorghe Hagi dava com o pé esquerdo na bola tinha algo de surreal. Parecia que o próprio objeto procurava os espaços, encontrando a melhor forma de transitar pelo campo. Ao longo do torneio, ele comandou o time: não apenas era o capitão, como o líder técnico da equipe. Dava lançamentos, fazia gols, abria espaços… Foram cinco partidas, superando equipes como as favoritas Colômbia e Argentina. Em todas, o número dez da Romênia esbanjou categoria e técnica.

Até hoje, quando falam como o futebol encanta e como ele pode se tornar deslumbrante, eu não penso em Pelé, Ronaldinho, Zidane, Ronaldo… O primeiro que me vem à cabeça é Gheorghe Hagi. Vocês podem até questionar, apontando que muitos outros jogadores tiveram carreiras mais regulares e bem sucedidas – além do mais, quando Hagi colocou grandes jogadores a seus pés eu tinha apenas dez anos. Então talvez as coisas nem tenham sido tão impressionantes como coloquei aqui, talvez este post seja apenas a idealização de um jogador que vi atuar e gostei. Mas, nostalgia ou não, é difícil analisar racionalmente uma situação quando se é criança e o número dez de uma seleção desconhecida encobre o goleiro com uma facilidade quase inacreditável. A cinquenta metros de distância.

Com vocês, nostalgia:

Cataclisma em Nova Iorque

Em tempos de verão, onde a única coisa mais constante do que axé nas rádios é a preguiça no corpo, pedir para outras pessoas realizarem o teu trabalho não é exatamente algo condenável. Por isso, após um sofisticado diálogo no MSN, descobri que o Guto não apenas havia assistido ao filme sobre o qual eu ia escrever como tinha idéias muito mais interessantes do que as minhas para o texto. Assim, surgiu a idéia de publicar a visão dele aqui no Cataclisma pois, além de enriquecer a coluna e fazer parceria com um excelente blogueiro, isso me deu mais uns minutos de Winning Eleven no dia de hoje (ei, são as pequenas coisas da vida que valem a pena). Meus sinceros agradecimentos ao cara por permitir que eu vá chutar a bunda da Inter de Milão nesta sexta-feira .

Interino

16:20:09 Guto: tchê, já viste Eu Sou A Lenda?
16:20:45 André: sim.. vi faz… uns 40 minutos, aproximadamente
16:21:03 Guto: Náufrago + Resident Evil, vai dizer
16:21:20 André: haahahahah
16:21:22 André: por aí

Me amarro nesses filmes de hecatombes colossais. Meteoros, vulcões, ataque alienígena, cataclismas de qualquer espécie. Se for daqueles que o cara acorda um belo dia e toda a civilização desapareceu (cof cof Extermínio), melhor ainda.

É o caso de Eu Sou A Lenda. No trailer já dá pra sacar qual é o pastel: depois que Nova Iorque é totalmente devastada por um vírus (cof cof Extermínio de novo), sobrou apenas Will Smith para viver grandes aventuras com um cãozinho da pesada em uma metrópole abandonada. /o/

No filme, Will Smith interpreta um militar/cientista auto-exilado que se dedica a encontrar uma cura para a referida moléstia. Gosto disso. Nos filmes-catástrofe o herói é sempre um (ex-)militar, cientista ou presidente dos Estados Unidos; condensar funções poupa a utilização de personagens secundárias cuja função é ser o primeiro a morrer.

Para não estragar a história, digamos apenas que o filme divide-se em duas seções distintas. A primeira meia-hora apresenta essencialmente a rotina do sujeito e suas estratégias de sobrevivência: buscas por mantimentos, tentativas de comunicação, experiências de laboratório –essa é a parte que vale a pena na película. A relação de Robert Neville com a cadela Sam é algo profundamente tocante. Um lance como a amizade entre o cara do Náufrago e a bola de voley, se bem que achei a interpretação da cadela um pouco mais convincente. Mais convincente que a atuação do Will Smith, inclusive. Saudade do Benji.

Os planos abertos mostrando a cidade desolada são outro trunfo – mas elogiar a fotografia de um filme é mais ou menos como comentar sobre ginástica olímpica masculina, então deixa para lá.

Mas aí vem a segunda metade do filme, quando Will descobre que não está sozinho no mundo e junta-se a uma galera do barulho que apronta as maiores confusões. E nessa hora, falando sério, dá vontade de rasgar o ingresso e sair do cinema. Monte de pontas soltas e peças desencaixadas. É tenebroso deduzir, durante a projeção, que o filme baseara-se numa obra literária ao perceber que um elemento lateral mal-explicado deve ter sido incluído porque era importante no livro.

+1 ponto pela cadelinha Sam, que me lembrou dos bons tempos de Secret of Evermore;

-1 por caracterizarem São Paulo quase como uma província indígena boliviana alheia à civilização. Contudo, serei complacente: do jeito que a gurizada anda escutando NX-Zero e TCHALIBRÁU, a possibilidade de que em 2012 ninguém saiba quem foi Bob Marley é considerável.

-1 pelo atrofiação social que vitima Robert Neville no exato instante que ele encontra outro humano. Forçado pacas.

+1 por mostrar aquilo que todo mundo sempre teve vontade de fazer em um filme de zumbis e passeatas pela paz: chamar no CARMAGEDDON e tocar a caranga pra cima da galera. Depois dar ré. Duas vezes.

+1 por provar que os efeitos especiais de Resident Evil nem eram assim tão ruins.

Avaliação final: três cenas de susto encagaçantes, de cinco possíveis.

Sessão "TV Aberta? Só de madrugada"

A Globo começou, segunda-feira, a transmitir a sexta temporada de 24 Horas. Como nem todo mundo pode ficar acordado para assistir nos horários inóspitos que a emissora escolhe (terça começou à uma e cinquenta da manhã; quarta, meia-noite e vinte), resolvi fazer resumos e postar todo sábado os episódios da semana. Já que o texto ficou comprido demais, novas estratégias de postagem serão adotadas nas semanas subsequentes – mas nessa primeira leva, tem que ser tudo de uma vez pra manter o andamento junto com as transmissões (ei, não reclamem, Jack Bauer aguentaria).

EPISODIO 1

Uma série de ataques terroristas abala os EUA quase tanto quanto o escandalo Clinton-Lewinsky. Para acabar com essa bagaceirice, a UCT faz acordo com um sujeito: em troca da localização do terrorista que está por trás dos ataques, decide entregar Jack Bauer. O agente, então, é libertado da prisão chinesa onde foi torturado por dois anos (possivelmente assistindo a programas de televisão locais) e chega aos EUA com um visual estilo “Náufrago”, além de visivelmente abalado por não conseguir ficar na China até as Olimpíadas. Gremista do jeito que é, Bauer tem culhões suficientes para aceitar a missão, mesmo sabendo que será sacrificado (sim, o governo fez um acordo do tipo “Ok, se ninguém matou o cara até agora, vamos dar uma ajudinha e entregar ele de bandeja”).

Paralelo a isso, uma família de muçulmanos é alvo de racismo nos EUA, para espanto geral; mas logo descobrimos que o guri realmente está envolvido com os terroristas, o que fez os conservadores gritarem “eu já sabia” pelas ruas.

Voltando à trama interessante: Chloe entra em atrito com Nadia, porque a novata é visivelmente mais gata. Fayed, o informante da UCT, dá a localizaçao do terrorista, mas logo explica para Jack Bauer que, na verdade, esse cara é bróder e pacifista – ou seja, o governo pretende eliminar o homem errado. Irritado com um clichê tão óbvio e desnecessário, Bauer realiza uma fuga absolutamente espetacular.

EPISODIO 2

Aproveitando que o terrorista Fayed teve uma “síndrome de vilão do 007” (contou o plano antes de matar o herói), Bauer avisa a gurizada do governo pra cancelar a missão pois Assad, o alvo, é o homem errado. Como um bom coadjuvante, o presidente não dá ouvidos para o protagonista, e isso obriga o agente a, sozinho, resgatar o sujeito segundos antes da série manter a média de uma explosão por episódio.

Enquanto isso, Ahmed – muçulmano que foi vítima de racismo mas está ligado com os terroristas – é atacado novamente pelo vizinho estereotipado (alto, branco e alemão… faltou só uma suástica nazista), elimina o cara e pega um pacote que estava escondido dentro da parede, mas é flagrado no ato por seu melhor amigo e fica de mal.

Do outro lado da cidade, Bauer e Assad, trabalhando juntos, COINCIDENTEMENTE encontram um homem-bomba (Los Angeles é pequena, mesmo) e o herói consegue fazer com que a detonação ocorra com apenas duas vítimas: o terrorista e a média de uma explosão por episódio. Na Casa Branca, o presidente recebe uma prova irrefutável de que ele cagou tudo ao não cancelar o ataque. Com tristeza, o líder da nação percebe que, se tivesse assistido às temporadas anteriores, saberia que nunca se deve descartar a opinião de Jack Bauer.

EPISODIO 3

Entediado com uma perseguição calma e controlada, Bauer joga seu carro em cima do veículo perseguido, obrigando o suspeito a pegar carona com Assad (que participava da operação, foi tudo planejado) e trazendo o nível de adrenalina da série de volta ao normal. Na Casa Branca, o presidente recebe uma ligação de Fayed: o terrorista propõe o cessar fogo em troca do clichê “libertem prisioneiros”. Esquecendo que o cara havia mentido não fazia nem um episódio, digo, hora, o líder do país aceita a proposta não porque acha que é a coisa certa, mas sim porque o roteiro precisa que ele faça isso.

Na outra trama, Ahmed pega a família de seu amigo como refém. Lesionado do jeito que está, exige que o pai do guri vá no lugar dele buscar um “componente”, além de obrigar o resto da família a torcer pelo Sayid em LOST. Ah, e em uma outra subtrama, a irmã do presidente é presa – mas ei, ela é negra e idealista, então não foi realmente uma surpresa.

De volta à perseguição: Bauer recebe apoio da UCT mas, como um bom terrorista, o suspeito manda eles às favas e o armazém pelos ares (“no mínimo uma explosão por episódio”, disseram os produtores). Recuperando os dados do notebook que sobreviveu à explosão (o que é uma mentira, na vida real só respirar perto do PC já faz com que ele fique azul e tranque), os agentes descobrem que Fayed quer explodir uma ogiva nuclear em Los Angeles (criatividade zero, convenhamos) – e, para isso, precisa de um dos prisioneiros que está sendo libertado em troca do cessar fogo proposto por Fayed. Mais uma Corinthianizada do presidente, hein? Bauer até avisa os caras, mas é tarde demais: o prisioneiro já havia sido liberado antes, e assim como o Palmeiras na vaga para a Libertadores 2008, a UCT fica no “quase”.

EPISODIO 4

A UCT descobre que Ahmed mantém uma familia como refém. Jack Bauer e sua equipe, então, vão lá pra chucknorrisear a situação e descobrir novas pistas sobre Fayed. Na Casa Branca, o presidente autoriza um documento de perdão à Assad, porque isso garante que o cara trabalhe com eles e também garante conflitos dramáticos entre o ex-terrorista e Curtis, braço direito de Jack.

Enquanto o homem que Ahmed mandou para entregar o componente alcança seu destino, dando aos caras o DRIVER do aparelho nuclear, os agentes tomam controle da situação e descobrem a localização de Fayed (e da bomba, consequentemente). Ainda na casa, Curtis se descontrola e ameaça Assad. Jack manda o cara parar, mas ele não ouve, então toma um tiro de aviso na garganta e cai no chão, morto. Visivelmente trêmulo por ter matado o amigo, Bauer liga pro seu chefe para dizer que cansou de ganhar milhões por temporada e não quer mais fazer aquilo.

A gurizada da UCT chega no esconderijo que nem adolescentes numa festa, ou seja, atirando pra todo lado. No entanto, ainda não houve nenhuma explosão nesse episódio. Isso quer dizer que um dos terroristas , FORÇADO pelos produtores (explosões dão audiência), consegue detonar o aparato nuclear. No meio de Los Angeles. Enquanto Bauer, chocado, calcula quanto a produção gastou em efeitos especiais, o governo descobre que existem mais quatro “maletas nucleares” dando banda por lá.

EPISÓDIO 5

Sendo o único vilão apresentado até aqui, Fayed escapou da bomba nuclear para que haja um antagonista. Jack Bauer salva um cara preso em um helicóptero (que caiu em cima de uma casa), mas não consegue salvar o piloto e o troço cai no chão – isso não tem nada a ver com a trama, mas resulta na explosão do episódio.

Já o presidente, cercado por estereótipos de militares, que infelizmente são tão tapados quanto os militares da vida real, pensa na retaliação. Seu cunhado, preso por engano, é utilizado pelo FBI como veículo para conseguir informação dos terroristas com quem divide o espaço, mas duvido que receba hora extra por isso.

A grande surpresa, entretanto, fica por conta dos familiares: enquanto a UCT encontra uma conexão entre o pai de Jack e os terroristas, Graem Bauer, o irmão, em um diálogo ridiculamente expositivo deixa claro que está contra o agente. Mas esqueceu que Kiefer Sutherland é o produtor e, obviamente, assistiu à cena antes do episódio ser finalizado. Assim, Jack Bauer encontra um irmão para um agradável bate papo, com bebidas, comidas, socos e ameaças de tortura. E, conforme a afinidade entre eles vai aumentando, as ameças tornam-se realidade. Ah, esses irmãos que vivem brigando…

Casualidades – Parte 6

Alguns momentos antes, Lucas e Jonas brincavam na calçada, certificando-se de ficar longe da rua como a sua mãe Ana Maria havia pedido. Cada um com uma caixinha de leite na mão, fingiam que eram piratas, viajantes espaciais, piratas espaciais, e mais centenas de fantasias que só a imaginação de uma criança de sete anos pode conceber, esperando o momento de receber os chocolates que haviam sido prometidos.

Mas do mercado a mãe não viu nem ouviu quando Jonas deixou cair o leite da sua mão, atingindo o chão com força e derramando o resto do líquido. Depois de chorar por alguns segundos, ele pediu um gole para o irmão – que, como qualquer parente, recusou, pois “tá quase acabando”. Uma breve discussão começou, até que Jonas tentou tirar a caixa de leite à força, iniciando um pequeno “cabo de guerra” com o objeto. Dando um último puxão, Lucas acidentalmente jogou a pequena caixa longe, acertando em cheio o pára-brisa de um carro.

Com o líquido branco cobrindo toda sua visão, o motorista tentou frear e virou o carro pra esquerda, escapando por pouco de atropelar um cachorro que passava por ali. No entanto a sorte também ficou pra trás, e a batida com outro veículo que vinha na direção contrária foi inevitável. Assustados com o barulho, os dois irmãos olhavam atônitos para a cena, sem conseguir mexer um músculo ou pensar no que deviam fazer. Finalmente, quando alguns minutos haviam se passado, Lucas conseguiu mover os lábios para sussurrar uma frase:

– Acho que acertamos alguém.

Parte 1 Parte 2 Parte 3 Parte 4 Parte 5

Bons tempos aqueles

“Fato: durante toda nossa vida cresce cerca de 560km de cabelo na nossa cabeça”. Quem foi criança na década de 90 sabe que, toda frase precedida por “Fato” será uma verdade surpreendente. E sabe também que um cara de cabelo estranho e jaleco verde, uma assistente esperta e um cara estúpido com roupa de rato podem fazer história na TV.

Beakman’s World é, provavelmente, o máximo que já se atingiu quando o assunto é TV educativa. A sua forma de explicar o mundo para crianças e jovens foi (ainda é) revolucionária, e esse mérito continua valendo – tente encontrar, hoje em dia, programas com essa qualidade.

A idéia de escrever sobre esse programa veio da minha última aquisição: o dvd The Best of Beakman’s World. Mesmo sem legendas ou áudio em português, é simplesmente demais.

E não é só pelas tiradas cômicas do Lester, pelos diálogos non-sense dos pingüins Herb e Don a cada início / término de programa ou pela forma hilária como eles explicam a ciência. É principalmente pela nostalgia que isso provoca, e pela renovação da esperança de que sim, pode existir TV educativa com qualidade.

Com vocês, ciência.

Tá no scritp

O Globo de Ouro foi a primeira vítima. Agora o Oscar é a grande incógnita, uma vez que a greve dos roteiristas continua e eles farão de tudo para dar sua letra, com o perdão do trocadilho – se bem que o sindicato dos diretores já renovou contrato, então não deve demorar para que os escritores entrem nesse trenzinho. No entanto, por precaução, talvez a Academia devesse acatar, ao invés do cartaz oficial da cerimônia, este outro que bolei especialmente para a ocasião:

Casualidades – Parte 5

A cada dia, Deus testa a nossa fé de formas diferentes. Pode ser em pequenos atos, pode ser em grandes questões, mas a nossa crença deve sempre permanecer igual, em intensidade e devoção. Esse homem grosso gritando com a menina do balcão, por exemplo: ele é só uma amostra de tudo o que precisamos enfrentar sem nos rendermos à ignorância, sem nos rebaixarmos ao seu nível. E toda essa raiva por nada, já que ele nem tinha razão na história.

Por isso eu sempre penso nos meus filhos antes de reagir ou fazer alguma coisa. É como se o Senhor dissesse: “Ana Maria, teu exemplo será seguido”, e eu realmente me acalmo e tento fazer o melhor para resolver a situação. Ainda mais em um lugar do bem como este, onde as pessoas te atendem com simplicidade e atenção, ajudando no que podem. Se existe tanto ódio, rancor e maldade no mundo, a melhor maneira de nos livrarmos disso parece ser dando o exemplo, para que nossos filhos e os filhos deles não cometam os mesmos erros.

Oh, mas perco tempo demais pensando nisso. Tenho que acabar as compras e encontrar os meninos lá fora. Só espero que não tenhamos que passar por nenhum mal educado que nem esse do mercado – o ódio é venenoso e pode contagiar as pessoas facilmente. Será que esse homem não pensa que pode machucar alguém desse jeito? Espero que ele não tenha cruzado pelos garotos, nem imagino que tipo de influência ele poderia passar. Oh, espero sinceramente que não.
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Best-Seller no ar

O Caçador de Pipas (The Kite Runner)
2/5

Direção: Marc Foster
Roteiro: David Benioff, adaptando o livro de Khaled Hosseini

Elenco
Khalid Abdalla (Amir)
Atossa Leoni (Soraya)
Homayoun Ershadi (Baba)

Um filme tão seco quanto as paisagens que aparecem nele.

Um best-seller “atual” (leia-se “envolvendo lugares que caem na prova de geografia do vestibular”) é adaptado para o cinema. A trama envolve o Afeganistão, os talibãs e alguma redenção por parte do protagonista.

Brincadeiras à parte, o filme é certinho: tem tudo no lugarzinho, atores bonzinhos, locações bacanas… No entanto, nada mais. É (imagino, pois não li) a história do livro, colocada de forma que as pessoas identifiquem determinadas cenas e digam que umas estão no texto, outras não.

O grande problema, então, é a falta de densidade às situações: o diretor espera que, apenas fotografando Hassan e Amir abraçados, o espectador possa considerá-los melhores amigos, mas isso não acontece. Quando o protagonista pede Soraya em casamento, não há absolutamente nada no filme que mostre esse sentimento (no entanto, o momento precisa estar ali, pois bota a história pra frente) . Os episódios são jogados na trama, encadeados pelos acontecimentos, mas simplesmente não conseguem cativar o público.

E isso enfraquece demais a película. Não há envolvimento da platéia com as personagens, pois eles parecem apenas realizar determinada função n. Assim, o arco dramático percorrido pelo protagonista não se justifica. A “mudança” dele ao longo do filme soa falsa, burocrática. Nada muito além de uma pipa que, ao invés de se mover de acordo com o vento, se move de acordo com as necessidades do roteiro.