Reunião Para Dominar o Mundo – 1

Sete homens entram em uma sala escura, repleta de luzes fracas e oscilantes, com uma mesa comprida e simples ao centro. Eles se olham com certa desconfiança por alguns segundos, e depois sentam na mesa, todos os sete: o líder, o advogado, o publicitário, o empresário, o médico, o político e o nerd. O líder começa a falar.
LÍDER
Boa noite a todos, e obrigado pela presença. Vocês estão aqui por um motivo, e apenas um motivo: a dominação mundial. O planeta jamais se encontrou tão disperso, tão desatento, e agora é o melhor momento possível para um grupo forte e sólido assumir o controle e manipular as vidas de bilhões de pessoas. Para isso, reuni aqui pessoas de áreas específicas e essenciais. Juntos, abrangemos todos os campos necessários para dominar o mundo. Temos um advogado, um publicitário, um empresário, um médico, um político e um geek.

EMPRESÁRIO
Espera, um geek? Geek não é um nerd? Sem ofensa amigo, mas por que precisamos de um nerd?
LÍDER
A cultura geek cresce vertiginosamente. Algumas das pessoas mais poderosas do mundo são geeks: Bill Gates, Steve Jobs, Peter Jackson.
PUBLICITÁRIO
Saquei, ele vai ser tipo um talismã da sorte.
EMPRESÁRIO
Tá, ok, entendo isso, mas com o que ele pode contribuir? E será que ele vai estar tão focado nisso quanto nós?
NERD
Claro que vou, dominar o mundo é a única forma de fazer o George Lucas parar de lançar novos filmes de Star Wars. Além do mais, não vejo vocês perguntando qual seria a função do médico.
LÍDER
As funções do médico são essenciais, indispensáveis e das mais variadas espécies. Se precisarmos eliminar alguém, por exemplo, o médico poderá dizer qual substância devemos aplicar na pessoa em questão e qual a dosagem ideal para que não levante suspeitas.
ADVOGADO
Isso não vai contra aquele tal de juramento de Hipócrates?
MÉDICO
Nah, eu cruzei os dedos enquanto fazia o juramento, então ele não vale.
POLÍTICO
Com licença, desculpem mudar o assunto, mas gostaria de expressar minha preocupação com a ausência de afro-descendentes no grupo.
EMPRESÁRIO
O que?
POLÍTICO
Acho que isso pode criar problemas caso consigamos realizar nosso objetivo. A população afro-americana poderá se voltar contra nós.
PUBLICITÁRIO
Políticos têm um botão do tipo “desligar modo campanha política”?
MÉDICO
Acho que o que ele diz tem certa coerência. Quer dizer, se um dia a gente tiver que conquistar uma vitória em uma partida de futebol, por exemplo, um negro viria bem a calhar no time, já que negros normalmente jogam melhor.
ADVOGADO
O que? Estamos querendo dominar o mundo, não a Copa do Mundo!
NERD
Já deixo avisado que meu médico me proibiu de fazer exercícios por muito tempo por causa de problemas no coração. Nas palavras dele, seria como ver um par de pilhas tentando bombear energia para um avião.
MÉDICO
Não tem problema, eu faço um atestado médico aqui te liberando pra jogar. Quer uma ritalina junto? Prozac? Pela sua aparência dá pra ver que você deve precisar comer Prozac no café-da-manhã, vou fazer logo uma receita para oito caixas.
NERD
Quero, tive que consumir todo o meu estoque de Prozac após o final de Game of Thrones.
LÍDER
Senhores, vocês estão perdendo o foco.
POLÍTICO
Estou apenas expressando uma realidade do público eleitoral.
ADVOGADO
Não tem problema, porque não estamos atrás de votos. A idéia é conseguir alcançar o topo do mundo não de forma democrática, mas sim enganando, dissimulando, manipulando e usando a força quando necessário, as mesmas técnicas que eu uso para conseguir sexo.
NERD
Só um segundo enquanto eu procuro “sexo” no Google.
POLÍTICO
Estou avisando, isso certamente criará problemas. Os afro-descendentes são bastante unidos e possuem um histórico de não se apequenar diante de confrontos, inclusive físicos.
PUBLICITÁRIO
Ele acabou de dizer “a negada desce o sarrafo quando a coisa fica preta” de forma bonita.
LÍDER
Senhores, já chega. Temos uma pauta. Vamos nos ater a ela.
EMPRESÁRIO
Qual é a pauta? Dominação mundial, só?
ADVOGADO
O que mais teria?
LÍDER
Sim, o único item na pauta de hoje é dominação mundial, está aqui na folh… espere, tem um item antes. “Conseguir uma mulher pra fazer cafezinho durante as reuniões de domínio mundial”.
MÉDICO
Apoiado. Sem cafezinho não dá.
LÍDER
O que é isso?
PUBLICITÁRIO
Eu botei na pauta. Acho que ia ser legal, sabe, café, reuniões secretas, mundo se curvando aos nossos pés e tal. Combina.
LÍDER
… muito bem. Alguém conhece alguma mulher que faça cafezinho bom e saiba guardar segredos?
EMPRESÁRIO
Mulheres não sabem guardar segredos. É um clichê, mas é verdade. Não há como impedir que elas troquem informações secretas. É como pedir a um homem que não olhe para um decote generoso.
ADVOGADO
Na verdade, acho que eu conheço uma, a Helena. Ela é bem na dela, faz um cafezinho ótimo e costuma ser bastante reservada. Trabalha lá em casa. Confio nela.
POLÍTICO
Tem certeza? A confiança é a base que sustenta a família e, portanto, a sociedade.
ADVOGADO
Tenho certeza, sim. Uma vez ela me pegou transando com uma mulher casada com alguém bastante famoso, e nunca disse uma palavra a ninguém e nem fez escândalo ao ver a cena. Apenas gentilmente disse “não” quando convidei ela pra se juntar a nós e foi fazer seus afazeres.
LÍDER
Bom, acho que então podemos trazê-la na próxima reunião e fazer uma tentativa…
ADVOGADO
Acho válido. E além de um bom cafezinho, ela faz deliciosos doces e salgados, quindins, beijinhos, folhados, de todo o tipo. Faz sob encomenda para festinhas e o preço é excelente, só não melhor do que a qualidade. Aqui, vou dar um cartão pra vocês falaram com ela quando forem fazer alguma confraternização.
PUBLICITÁRIO
Po, quanto tu ganha de comissão dela?
ADVOGADO
… ganho 30%, por que?
LÍDER
Certo. Então, para a próxima reunião, trazemos a Helena para cuidar das necessidades gastronômicas e começamos a elaborar nosso plano de domínio mundial. Quero ver idéias, bastante idéias, precisamos começar logo. Nos encontramos semana que vem e não esqueçam: nós nunca estivemos aqui. Ah sim, e me dêem os tickets de estacionamento pra eu carimbar.

Diálogos na sala de cinema

Sentado na minha poltrona, esperando começar Carros 2, vi um daqueles trailers que terminava com o anúncio “Disponível em 3D e também em 2D”. Eis que, de algum lugar da sala (ou de algum limbo onde as pessoas precisam pagar pra ter inteligência e algumas simplesmente não possuem dinheiro para isso), ouço o seguinte diálogo:

– Em 2D? Mas o que é esse 2D?

– Ah, 2D é um 3D falsificado.

A resistência

500 milhões de usuários. 500 milhões. O império que Mark Zuckerberg criou com o Facebook deixa comendo poeira outros famosos, como o império romano, o de Alexandre e até mesmo o de Luis Felipe Scolari. Mais do que isso, o Facebook, tal qual uma menina de quinze anos, quer ser sempre o centro das atenções – para isso, faz parcerias, estende seus tentáculos até onde pode. Como resultado, hoje tudo é integrado ao Facebook, desde os comentários no Rotten Tomatoes até qualquer promoçãozinha de qualquer site. Ou seja, a sua identidade do Facebook está ali presente em boa parte das oportunidades virtuais que aparecem.
Fico imaginando quando surgirá “a resistência”. Um grupo de pessoas que defenda o anonimato na rede e a liberdade de navegar por onde quiser sem identificação, que tome o caminho contrário e procure dispersar ao invés de integrar ou agrupar. E talvez a ideologia deles cative as pessoas, talvez não, mas de uma coisa eu tenho certeza: se em algum momento se autoproclamarem “piratas” e colocarem tapa-olhos nos avatares das redes sociais, podem contar comigo.

Em prol do futebol

As coisas andam complicadas no futebol. A emoção está se esvaindo dos jogos, e ninguém parece perceber ou fazer algo a respeito. Portanto, como um apaixonado por futebol, decidi criar este manifesto para salvar o esporte bretão enquanto ainda é tempo. Desculpem pela longa extensão do texto, mas tempos desesperados requerem medidas desesperadas e posts mais compridos.
1. Das camisetas
1.a – Cada clube poderá ter no máximo duas camisetas
Todos os clubes de todas as séries existentes terão apenas duas camisetas, uma titular e uma reserva, mais a vestimenta do goleiro. Uma terceira camiseta reserva é permitida, desde não seja vendida comercialmente e seja usada apenas em casos de vida ou morte.
1.b – Camisetas deverão respeitar as cores do clube
Cada camiseta deverá se manter fiel ao manual de identidade do clube, evitando fugir para padrões estéticos muito elaborados e cores de meninas. As camisetas também não poderão brilhar no escuro (ouviu, Palmeiras?).
1.c – Patrocinadores
Cada clube poderá ter no máximo dois patrocinadores na camiseta, sob pena de ser desclassificado de tudo para sempre. Os patrocínios devem se adequar às cores da vestimenta quando necessário.
2 – Da arbitragem
2.a – Escola de árbitros
Os árbitros não serão mais formados em escolas tradicionais, e sim em diversas academias de Pancrácio (arte marcial grega) ao redor do planeta. Tudo aquilo que os juízes permitirem que os lutadores de pancrácio façam, os árbitros permitirão aos jogadores fazer também.
2.b – Punição em campo
Qualquer tentativa de simular uma falta ou ludibriar o árbitro será punida da seguinte forma: o jogador em questão terá que ir para uma goleira e, de lá, correr até encostar na outra. Nesse meio tempo, os jogadores do time adversário têm liberdade para fazerem o que quiser com o colega punido. No entanto, para preservar a integridade física do atleta, manteremos um número de no máximo 30 chutes e/ou soco por jogador.

3 – Dos times
3.a – Volantes
É obrigatória a escalação de no mínimo dois volantes em todos os times de todas as divisões, sendo que um deles deve ser treinado em luta corpo-a-corpo pelo exército israelense. Os volantes só poderão sair de campo para dar lugar a um zagueiro, a não ser quando o time estiver perdendo: nesse caso, é permitida a troca de um volante por um meia de cabelo comprido.
3.b – Dieta dos jogadores
Durante a concentração pré-jogo, os jogadores poderão consumir apenas churrasco e cerveja, sem exceções, buscando o equilíbrio alimentar ideal para a partida. Caso algum jogador necessite de mais energia no corpo, é permitido o consumo de até duas barras de cereais, desde que sejam do sabor mulher.
3.c – Premiações
Dada a constante busca dos atletas por dinheiro e a constante falta de vontade que mostram quando não há uma recompensa monetária satisfatória, quando de grandes títulos e conquistas os jogadores serão premiados com uma licença para não levar um tapão na cabeça após a partida.
4.c – Comemorações
Não será permitida nenhuma comemoração que fuja do conceito “completamente alucinado”. Dancinhas, sambas e dedos na boca serão severamente punidos com a morte.
4.d – Cortes de cabelo
Qualquer coisa que fuja da estética “ser humano” está terminantemente proibida. Caso a regra não seja respeitada, haverá sempre um grupo de índios em volta do campo para escalpelar o infrator.
4 – Dos estádios
4.a – Gramado
O gramado deverá ser composto por grama normal, e não grama artificial. Os únicos cortadores de grama permitidos são aqueles clássicos que usávamos para cortar a grama do jardim de casa – caso algum clube quebre a regra e utilize um cortador mais evoluído, durante três meses a grama do seu estádio será cortada apenas por cavalos pastando.
4.b – Condições climáticas
A cada rodada no mínimo três partidas devem ser jogadas na chuva. Se o tempo conspirar contra as regras aqui determinadas, o gramado deverá ser violentamente molhado alguns minutos antes de partida e durante o intervalo para permitir os tradicionais carrinhos de 100m.
4.c – Produtos alimentícios
No estádio só será permitida a venda de cerveja e água para o público. Menores de 15 anos poderão tomar refrigerante, desde que vá uma dose de vodka junto. A venda de qualquer alimento remotamente saudável acarretará na exclusão do bar.
5 – Da imprensa
5.a – Entrevistas em campo
As entrevistas serão dadas apenas em um recinto propício chamado “sala de imprensa”, que todos os clubes possuem, embora aparentemente os jornalistas não saibam disso. Qualquer repórter que pisar no campo será imediatamente considerado um inimigo armado e perigoso e, portanto, tratado como tal.
5.b – Nomenclaturas
A imprensa fica, por meio deste, proibida de chamar de “craque” qualquer jogador que tenha transado com menos de 200 mulheres.
5.c – Edição de imagens
Não é permitida a edição de imagens mostrando lances de “habilidade” que resultaram em nada. Todas as imagens exibidas serão de jogadas e lances que resultaram ou em gol ou em pancadaria desenfreada.

As escadas rolantes

Eu nunca entendi bem as escadas rolantes. Elas sempre me pareceram como recurso de uma sociedade preguiçosa, que está sempre atrás de uma forma de fazer menos, se esforçar menos, suar menos. Só isso mesmo pra explicar tempo e investimento gastos concebendo uma nova forma de subir escadas.
Mas então eu finalmente fui fazer uma viagem fora do Brasil, conhecer o mundo. Fiquei quase um mês circulando pra lá e pra cá, desbravando diferentes cidades. E é um movimento contínuo, quase como uma escada rolante: cada vez que eu e meu irmão chegávamos ao final de uma temporada em alguma cidade e passávamos a outra, era necessário reiniciar todo o processo de descoberta, de maravilhamento. Chegar em cada país “zerado”, pronto pra tentar absorver o máximo possível de informação, cultura, beleza, costumes, sensações e todas aquelas coisas que tornam uma cidade um lugar único e inesquecível.
E que experiência descomunal que é conhecer novos lugares, ainda mais quando são algumas das maiores e mais famosas cidades do mundo. Desde a esquisita sensação de falar português no trem e saber que (provavelmente) ninguém está entendendo uma palavra até o arrebatamento completo ao ver ao vivo coisas que antes só existiam em fotos ou gravações – Torre Eiffel, Big Ben, Emirates Stadium, as casas inclinadas de Amsterdam, o muro de Berlim, o clima medieval de Bruges -, praticamente tudo resulta em um sorriso ou em um coração sobrecarregado de tanta felicidade (Londres, eu te amo. Paris, te aceito como minha amante. Amsterdam, me encontre no motel amanhã à noite). Mais de uma vez senti como se estivesse caminhando em um filme, e mais de uma vez senti vontade de abraçar os pubs de Dublin ou as novas e velhas belezas de Berlim. E beber aquelas cervejas de Bruxelas (= melhores do mundo) a preços ridículos de tão baratos é, apesar do que eu acabei de falar, algo que não tem preço.
Com o tempo, o deslumbramento inicial vai dando lugar a uma admiração ainda mais intensa, já que começamos a identificar certos pontos, certas regiões, saber mais ou menos por onde estamos andando e pra onde temos que ir. E talvez não haja nenhuma forma de conexão maior com uma cidade do que fazer seu próprio caminho para ir de um ponto ao outro, fugindo das rotas de mapas e guias. E não é só a questão de pegar um atalho ou um trajeto distinto, mas sim de passar a entender a cidade de uma forma pessoal, compreender ela de um jeito diferente. Descobrir bares e cafés e parques e praças e lojas e ruas e esquinas que não são famosos, conversar com pessoas que não foram treinadas pra atender turistas, viver um pouco da vida que se vive lá. Pro resto do mundo pouco vai importar o falafel que comi em Paris, ou os canadenses que saíram comigo e com o meu irmão pra caminhar bêbados pelo Distrito da Luz Vermelha em Amsterdam, ou a francesa que falava “ratatouille” ao invés de “rat” porque quando um dos bichinhos apareceu eu disse “olha o protagonista do filme Ratatouille”. Mas são situações que fizeram parte da viagem e eu vou identificá-las com suas respectivas cidades pra sempre.
Porque a melhor forma possível de tentar conhecer algum lugar é simplesmente calçar os tênis e sair caminhando rua afora (claro, é impossível fazer isso todas as vezes; entretanto, o fato de ser impossível não é desculpa pra não tentar). Então nós acordamos cedo e dormimos tarde, caminhamos por horas e horas debaixo do sol, criamos bolhas nos pés, suamos, somos castigados com dores musculares, ficamos cansados, e ainda assim dedicamos todo o esforço possível para nos apaixonar e nos envolver com cada cidade. E elas, em um gesto pequeno mas significativo, nos oferecem de vez em quando a oportunidade de descansar momentaneamente sem perder um segundo do nosso precioso tempo, de seguir o caminho ao mesmo tempo em que relaxamos por um breve espaço de tempo. Porque só após viajar pras principais cidades do mundo, caminhar dia e noite pelas principais cidades do mundo e ficar com as pernas doídas pelas principais cidades do mundo é que eu entendi e passei a dar o valor merecido às escadas rolantes.