Pelada sem juiz

Cruzeiro 3 x 1 Grêmio
Gols: Wellington Paulista, 37’1°T, Wagner, 2′, Fabinho, 21′ 2°T (Cruzeiro); Souza, 33′ 2°T (Grêmio)
Local: Estádio Mineirão

A frase ideal para iniciar o texto seria “uma vitória do Grêmio contra o Cruzeiro, no Mineirão, é tão provável quanto uma vitória dos Estados Unidos contra a Fúria Espanhola”, mas os ianques não apenas corroboraram a sorte da seleção de Dunga como estragaram o início desse post. Enfim, o tricolor chegou em Minas com cara de mau e disposto a amarrar esse tabu numa pedra e jogá-lo no rio.

A partida começou parelha. O Cruzeiro controlava mais a bola, mas, tal qual o melhor amigo de uma garota bonita, desfrutava da companhia sem conseguir ir às favas. A equipe estrelada encontrou pela frente um Grêmio sólido, que se mantinha defensivamente e criava boas chances no ataque – duas delas jogadas no lixo por Alex Mineiro, e uma perdida por Máxi Lopez, que depois do lance deveria mudar seu nome para MINI Lopez, uma vez que um caramujo reumático faria o gol que ele perdeu. A raposa também teve suas oportunidades, e jogo fluía com grandes chances de pauleira descontrolada graças à conivência do árbitro. No entanto, em uma escapada marota pela direita, Kléber Gladiador cruzou e Wellington Paulista, aproveitando-se que Léo tentava dividir de cabeça 8.354 por 684, pegou Marcelo Grohe no contrapé e fez o crime. E a etapa 1 ficou nisso.

A etapa 2 trouxe a campo um Cruzeiro aloprado. Já aos dois minutos, Wagner arrematou de fora da área, a bola passou por onde os culhões de Tcheco estariam se ele os tivesse, desviou e enganou o arqueiro tricolor. Depois a zaga gremista estendeu um tapete vermelho e enviou um convite para que Fabinho entrasse na área e desviasse um cruzamento de cabeça, fazendo 3 a 0. Estávamos apenas na metade do primeiro segundo tempo, e o Grêmio parecia liquidado como uma blusa fora de moda.

A pressão cruzeirense cessou quando o juiz botafogueou e pediu pra sair, acusando uma distensão na panturrilha. Então o tricolor gaúcho, com Herrera no lugar de Alex PÃODEQUEIJO, partiu para abocanhar seu pedaço de esperança. Os gremistas circundavam a área adversária infrutiferamente até que, aos 33 minutos, Souza cobrou uma falta que poderia ser capa da Playboy e descontou. A partida continuou tensa até o apito final do quarto árbitro, mas não passou disso. Semana que vem, tem o jogo de volta, no Olímpico, um simples dois a zero bota o Grêmio na final da Taça Libertadores da América. E dá.

Meu amigo regulamento

Grêmio 0 x 0 Caracas
Gols: Nem
Local: Estádio Olímpico Monumental, Porto Alegre

Ah, o Grêmio. Time de tantas tradições, tantas conquistas, tantas vitórias. Equipe peleadora, que se atira sobre o pescoço do inimigo na primeira oportunidade, que briga até o apito final, e as vezes até depois do apito final. Esse Grêmio, cativante, arrebatador, encara o mundo moderno com desprezo e não abre mão de seus antigos hábitos: ainda estão lá a raça, a entrega, o coração, e, claro, a obrigação de se classificar no último suspiro, mesmo enfrentando uma equipe de cadeiras de praia.

O Caracas veio a Porto Alegre com a impossível missão de vencer ou empatar com gols. Digo “impossível” porque um time daqueles não merece confiança nem para atravessar a rua. Aliás, eu sequer deixaria o Caracas tomando conta do meu cachorro enquanto vou à padaria. O fato é que a equipe venezuelana chegou aqui e deu de cara com um Grêmio bem articulado, onde Tcheco distribuía passes como quitutes em uma festa e Adílson elevava-se à décima quarta potência. Mas as chances de gol esbarravam no cabelo esvoaçante de Xuxa López, que não convertia as intrincadas tramas em tentos. Seguiram-se mais alguns minutos de uma onda batendo contra um rochedo, um pênalti claríssimo não marcado a favor dos tricolores e a sensação de que a partida já poderia estar liquidada.

Veio o segundo tempo, e como uma sequência Hollywoodiana o Grêmio continuava com os mesmos erros. A ladainha se repetiu até o final, quando a tradição de se classificar no sufoco entrou em campo e a cueca apertou. O Caracas teve seus momentos de lucidez e quase se classificou num lance onde Réver deu o maior carrinho da história do universo, e em outro onde o atacante venezuelano decidiu continuar virgem e ignorou o gol aberto, cabeceando pra fora. A equipe tricolor ganhando as vagas para as semi, e agora enfrenta São Paulo ou Cruzeiro, mas é preciso melhorar: nem sempre o Regulamento estará disponível para ser escalado.

Curtas

O Grande Lebowski – 5/5
É dos Irmãos Coen. Nada mais precisa ser dito. Genialidade absoluta;

The Spirit – 1/5
Minha alma me deixou depois de assistir a duas horas dessa demência fílmica;

Madagascar 2 – 2/5
Vale a pena quando os pinguins estão em cena. Já as personagens principais são chatas, burocráticas e menos interessantes do que lavar a louça;

O Casamento de Rachel – 4/5
Um dos melhores roteiros do ano (passado). Consegue tratar todas as personagens de forma crível e não estereotipada, o que já é mais do que 90% dos filmes. Anne Hathaway completamente em chamas;

Homens Brancos Não Sabem Enterrar – 5/5
Woody Harrelson e Denzel Washington, alucinados, formam uma das maiores duplas da história do cinema;

Virtude Fácil – 3/5
Poderia ser chamado também de “Colin Firth e o timing cômico definitivo”. E a Jessica Biel é o Rubinho das cenas dramáticas: sem carisma, sem emoção, sem sucesso;

Quatro Amigas e um Jeans Viajante – 4/5
Passa de um filme bobinho a um estudo sobre as motivações e desilusões de suas protagonistas antes que se possa dizer “enchi o saco desse filme de menina”

A Rainha – 5/5
Tipo de filme contemplativo que, apesar de sua narrativa cadenciada, magnetiza os olhos do espectador na tela o tempo todo;

O Leitor – 3/5
As idas e vindas temporais na história prejudicam o desenvolvimento da trama, construindo apenas um bom filme. Mas ei, a Kate Winslet aparece nua;

RocknRolla – 3/5
Guy Ritchie voltou aos filmes de gângsters, mas ainda não voltou à sua melhor forma;

Quantum of Solace – 4/5
Daniel Craig bota Pierce Brosnan no bolso. Não é um Cassino Royale, mas funciona;

Eu, Meu Irmão e Nossa Namorada – 3/5
Comédia romântica tradicional com alguns momentos acima da média. Bom pra assitir com a patroa;

Dúvida pertinente

Ouvi dizer que surgiu um novo reality show chamado A Fazenda (título mais que apropriado: temos a mulher-samambaia, a Marina Mantega, mais um monte de asnos, e todo mundo entrou lá achando que iriam lavar a égua sem saber que vão acabar dando com os burros n’água). Esse ano já tivemos BBB, parece que o tal No Limite vai voltar, entre tantos outros que preenchem a falta de criatividade da televisão com criatividade em falta.

A principal característica desses programas é que não precisamos ficar com o ouvido na porta: tudo que acontece ali, da coisa mais insignificante à coisa mais insignificante, é ampla e maciçamente divulgado pela Grande Mídia (óh, poderosa, alimentai-nos). Fulana saiu pra tomar banho de sol com o biquíni aparentemente enfiado no rabo por um míssil Tomahawk? É notícia. Fulano conseguiu soletrar a palavra “copo” após doze tentativas? Notícia. Incidente pequeno causa discussão violenta, que gira em torno de cinco frases, todas elas colocando a mãe de algúem como uma senhora que pratica atos imorais em troca de compensação financeira? Manchete de capa, logo acima da chamada para o editorial, que condena toda e qualquer forma de violência.

Pois bem. Notícias sensacionalistas sem relação com a “trama” original; exposição de eventos insignificantes para manter a pauta; aproximação da câmera e close em imagens dramáticas para dar intensidade e comover o público.

Corrijam-me se eu estiver errado, mas… é o desaparecimento do vôo 447 da Air France um reality show?

Julgando um livro pela capa

Esses tempos eu estava circulando por uma MEGASTORE (usei a grafia antiga, não sei como as palavras em inglês ficaram depois da reforma ortográfica) atrás de um livro legal e interessante e diferente. Então fui desbravando os corredores, atento a qualquer coisa que me chamasse a atenção, mas tudo que encontrei foram diversas agulhas no palheiro e um volante para o time do Grêmio. Uma tarefa agoniante, principalmente pelo fato de que eu simplesmente havia ignorado a existência de boa parte daqueles autores até esbarrar com seus sobrenomes estranhos na prateleira. E a organização implementada por essas MEGASTORES realmente me dá arrepios. Primeiro, porque quem gosta de organização é terrorista. Segundo, porque a menos que um sinalizador com dizeres como “Nick Hornby” seja disparado, eu não encontro nada do que procuro. E terceiro, porque a coisa é direcionada apenas para as pessoas que sabem o que querem, e ignora completamente quem não sabe o que quer – o letreiro podia muito bem mudar de MEGASTORE para ENSINO SUPERIOR.

Logo constatei que para ter sucesso na empreitada seria necessário um processo de triagem. Minha reação quase imediata foi descartar drasticamente aquelas obras com críticas positivas na contracapa, porque auto-afirmação é para os fracos. Tipo, o cara pega um livro desconhecido, olha atrás pra ver a história, e ao invés disso descobre que aquelas páginas contrastam visceralmente duas culturas exóticas de países distantes, fazem um retrato brutal da geração que teve seus sonhos perdidos em guerras pessoais e espirituais, e uma vez até salvaram um gato de uma árvore. Daí pega o livro do lado e é a mesma coisa, e o outro idem. Eu até acreditaria que quatro livros aleatórios de autores desconhecidos mudaram o mundo, mas só em um universo onde o Barcelona joga com quatro Messis. E, devo confessar, também sinto-me ofendido quando alguém que eu não conheço resolve duvidar da minha capacidade e tenta explicar a mensagem do livro na contracapa, antes mesmo que eu possa ler. Se eu quero interpretar A Revolução dos Bichos como uma fábula que narra a trajetória de Celso Roth no Grêmio, ninguém tem nada a ver com isso.

Feito isso, procurei me ater à nomes de autores que reverberavam na minha cabeça mas que eu nunca tinha lido. A idéia me arrastou até a prateleira que orgulhosamente ostentava livros de Phillip Roth (nada a ver com o Celso… espero). Os preços me arrastaram de volta até o limbo. Saramago e Gabriel Garcia-Marquéz todo mundo tem pelo menos um, é mais fácil pedir emprestado. Achei um do Woody Allen interessante, mas lembrei de Scoop e botei de volta. E assim a coisa foi, e tinha tantos livros lá, e tantos deles se diziam tão assustadoramente bons ou tão impressionantemente caros, que por um momento decidi, após essa extensa pesquisa, levar pra casa o disco novo do Bruce Springsteen.

Entretanto, resolvi dar mais uma chance à arte literária, porque eu precisava matar tempo na loja. Caminhei aleatoriamente pelos corredores, incauto, sem realmente olhar as coisas. Como quem não quer nada, fui ali na letra D, ver como andava o Phillip K. Dick. Sem compromissos, só conferir as sábias palavras do velhote visionário. Eis que nos livros dele eu vejo um tal de O Homem do Castelo Alto. Puxei a papelada e olhei na contracapa. Tinha um resumo da história, ao invés de críticas publicitárias. Olhei o preço. Em conta. Conheço um pouco do trabalho do sujeito, e sei que ele é bom. A coisa era promissora. Então eu prestei atenção na capa novamente, e ela era legal. Muito legal. Bem bolada, simples, sem exageros, sem firulas desnecessárias. E me pareceu bem mais lógico confiar em capas do que em contracapas. Elas parecem mais sinceras.

Deixei o Boss de lado e fui satisfeito até o caixa. De repente até conseguiria algum desconto no cartão de pontos.

Blade Runner who?

Óleo nas canelas

O Exterminador do Futuro: A Salvação (Terminator Salvation)
3/5

Direção: McG
Roteiro: John D. Brancato e Michael Ferris

Elenco
Christian Bale (John Connor)
Sam Worthington (Marcus Right)
Anton Yelchin (Kyle Reese)
Moon Bloodgood (Blair Williams)

John Connor e a resistência da humanidade, na luta contra as máquinas, atiram e explodem um monte de coisas. Além disso, há uma subtrama envolvendo o pai do cara (que, por essas brincadeiras de viagem no tempo, é mais novo que ele) e outra onde um sujeito simplesmente acorda no futuro. Mas elas também ficam na luta contra as máquinas, tiros e coisas sendo explodidas.

Quando uma franquia arrecada bilheterias avassaladoras ao redor desse nosso mundinho, é comum ela ter um spin-off, ou seja, uma produção que é minimamente ligada à obra original mas que não necessariamente dá continuidade à trama – um exemplo é X-Men Origins: Wolverine, spin-off de X-Men.

Pois O Exterminador do Futuro: A Salvação poderia ser um desses. Ao longo de seus 130 minutos, a tramóia do filme não acrescenta nem subtrai nem muda nada da cronologia iniciada por James Cameron em O Exterminador do Futuro. Apenas pega aquele universo, tomando emprestado uma ou outra personagem já conhecida, e constrói um episódio autossuficiente.

Então, livre das amarras de uma linha cronológica já bastante complicada, a película investe em uma narrativa simples e alucinante, onde tiroteios são o acento das palavras, perseguições são as frases e explosões são os pontos finais. Há até uma tentativa clichê de desenvolver as personagens aqui e ali, mas é igual ao sujeito que abre a porta do carro para mulher apenas porque sabe que faz parte do processo de levá-la para a cama. A história é basicamente empurrada pelas sequências de ação, que, no geral, são extremamente eficientes. Se por um lado não há nada memorável, digno de espraiar alguma nova arte marcial pelo mundo, por outro a crueza dos EMBATES acaba mergulhando o espectador na produção. As coreografias ressaltam aquela atmosfera meio de improviso, onde todo o ambiente pode ser transformado em arma, e isso ajuda a conferir o clima de guerra entre humanos e máquinas. No meio dessa algazarra acabam chamando a atenção o design de som (típico filme para se ver no cinema) e os efeitos especiais, que de tão críveis e grandiosos me levaram a pensar que a tecnologia usada para criá-los é mais avançada do que a tecnologia usada pela Skynet do filme para criar os robôs.

Tirando isso, sobram apenas uma ou outra frase batidas e previsíveis. E se o quarto filme da série não tem culhões para virar clássico como os dois primeiros, ao menos faz algo diferente e mantém-se eficiente dentro de sua proposta (ação desenfreada e alucinada). Caso as bilheterias sejam gordas, acredito que haverá uma nova sequência. Aí vamos ver se os roteiristas conseguirão levar a intrincada questão dos paradoxos temporais de volta para o futuro.

Sai que é sua!

Toda a rivalidade que existe entre duas torcidas de times de futebol, como as de Grêmio e aquele outro time de Porto Alegre, é capaz de transformar heróis em vilões, dependendo simplesmente do ponto de vista. Pergunte, por exemplo, o que qualquer não-são-paulino acha do Rogerio Ceni, o maior ídolo da história recente do futebol brasileiro.

Mas tem caras que ficam acima disso. Jogadores tão carismáticos que caem nas graças da torcida das cores que defendem e que nem por isso deixam de ter o respeito e, porque não, o carinho de torcedores contrários. Um bom exemplo disso é o Marcos, goleiro do Palmeiras que recusou propostas do futebol europeu na melhor fase de sua carreira para trazer o alviverde de volta à elite do futebol nacional.

Um dos maiores exemplos de ídolo acima de qualquer torcida é o Taffarel. Hoje deu na TV uma entrevista do Galvão Bueno com ele. Maior goleiro da história da seleção brasileira naminha opinião, Taffarel jogou no Inter. E quando o narrador/jornalista/mala tentou aguçar o sentimento de rivalidade ao mencionar os dois testes nos quais o goleiraço foi reprovado pelos avaliadores gremistas, Taffarel tratou logo de frustra-lo ponderando que as bombas foram justas: “Eu não era goleiro de verdade na época, meu esporte era o vôlei. Caí em cima da bola e o treinador disse que era melhor eu desistir pra não me machucar.”

Em outro trecho da conversa, diante da afirmação de que ele nunca teria se metido em confusão durante a carreira, Taffarel relatou como pulou o alambrado para curar, à base de porradas e safanões, o porre de um torcedor que o chamara de frangueiro. Então, o reticente apresentador murmurou que era um fato de se arrepender até hoje. E o goleiro, como bom gaúcho que é, interrompeu bradando que aquilo foi a melhor coisa que ele poderia ter feito. Que descarregou toda a raiva daquele momento, tanto ele quanto o torcedor. E que depois de uma noite na delegacia, ambos já estavam se dando bem.

O que foi que fizeram com o futebol? Maldito fair play!