Todo mundo é de ferro

Homem de Ferro 3 (Iron Man 3)
3/5

Direção: Shane Black
Roteiro: Shane Black e Drew Pearce

Elenco
Robert Downey Jr. (Tony Stark)
Gwyneth Paltrow (Pepper Potts)
Ben Kingsley (Mandarim)
Guy Pearce (Aldrich Killian)
Rebecca Hall (Maya Hansen)
Don Cheadle (coronel James Rhodes)

Traumatizado após enfrentar um monte de CGI em Os Vingadores, Tony Stark tem problemas pra dormir, problemas com Pepper e passa o tempo construindo homens de ferro para serem seus amigos e jogarem Imagem & Ação com ele. Mas daí um terrorista chamado Mandarim começa a tocar o terror nos americanos e, para proteger seu país e seus amigos e sua noiva e seu ego, Tony veste a armadura e sai pra descer o sarrafo na galera.
Homem de Ferro 3 é o típico filme da Marvel: preguiçoso, seguro, se apoiando em piadinhas e efeitos especiais (e, no caso específico do Homem de Ferro, um protagonista completamente em chamas). É a fórmula de sucesso da FIRMA, e aparentemente vão investir nisso enquanto a galera continuar dando milhões de verdinhas para assistirem aos filmes – mas, se por um lado isso garante a comida no prato dos executivos da Marvel, por outro acaba resultando em coisas completamente desnecessárias, fazendo com que Robert Downey Jr. tenha que se desdobrar para que o filme não enferruje (desculpem).
A única pessoa do mundo que realmente tem problemas se esquecer onde deixou o carregador.
Mas há de se convir que, na real, a franquia é um grande playground/plataforma de exposição para o Beto Downey. E ele faz por merecer: compondo Tony Stark com uma energia frenética, inquieto, decidido, carismático ao extremo e com um timing cômico aniquilador, o ator pega o espectador pela mão e carrega ele até o final do filme – um competente e divertido showman. E em Homem de Ferro 3 ele trabalha junto com um elenco competente, que consegue criar cada personagem única e bem definida – com grande destaque, claro, para Ben Kingsley, que só não disputa corpo-a-corpo com Robert Downey Jr. porque aparece menos tempo. Ah sim, o Guy Pearce fica meio atrás dessa turma, mas ao menos aqui a maquiagem dele não é fracassada (abraço, Prometheus).
Infelizmente, o talento dessa galera atuante não é explorado como poderia porque, bem, porque Homem de Ferro 3 não tem exatamente uma história. É tipo uma colagem de piadas e cenas de ação e encheção de linguiça desenfreada. E não falo aqui nem de desenvolvimento de personagens ou de conflitos emocionais (apesar da coisa do trauma de Vingadores tente fazer isso, e há uma possibilidade nunca explorada de fazer algo no estilo “biologia x máquina”, nunca concretizado), porque exigir isso de um blockbuster é meio que um convite à decepção (embora aconteça), mas do próprio andamento da trama. A impressão geral é a de que, após o Mandarim brincar de Lego com a casa do Stark, a produção fica enrolando pra ter mais tempo de tela. O investimento na história é tão raso que sequer há um motivo para o vilão fazer o que faz. Ele simplesmente comete atrocidades, e tem um plano completamente elaborado e tal, e aparentemente faz tudo isso para evitar o tédio, já que a película nunca explica o objetivo dele com toda essa balbúrdia. Isso torna Homem de Ferro 3 lento, arrastado, uma versão cinematográfica de domingo. E mesmo que tenha momentos inspirados ao longo da projeção (a forma inteligente com a qual Tony chuta a bunda de uma mina lá ou vários dos diálogos do protagonista), o filme volta e meia apela para soluções forçadas, como o inexplicável holograma do teatro (onde a linha divisória entre tecnologia e mágica é praticamente inexistente) ou diálogos ridiculamente expositivos (como quando alguém fala “então você vendeu para o Mandarim?”, algo que já ficou claro na introdução do filme. Até na sinopse, se bobear).
Shane Black dirige o filme de forma competente, mas meio automática. Tem uma visão boa da ação e consegue deixar claro o que está acontecendo e quem está envolvido (algo particularmente difícil na finaleira, quando a robozada entra em cena sem piedade), mas, com exceção da já citada cena onde a casa literalmente cai (que é tensa pacas e consegue ser surpreendente), não há nada realmente empolgante ou envolvente. Não que seja ruim, também, apenas segue a cartilha com eficiência. Os efeitos especiais são espetaculares, e só aquela cena do avião já seria de dar tapinhas nas costas, mas isso já estava previsto no preço do ingresso (os efeitos sonoros são incrivelmente incríveis, também. Mereciam um Grammy). Toda a parte técnica, aliás, é bem redondinha, e até mesmo o cuidado com o design das várias armaduras é uma atração à parte (faltou alguma que fizesse homenagem ao Wall-E, mas ok, fica para a próxima).
Ou seja, Homem de Ferro 3, assim como o 2, é mais um filme insosso nesse grande buffet de INSOSSIEDADE desenfreada que são os filmes da Marvel. Tem momentos divertidos, é bem produzido, alguns diálogos bons, algumas piadas engraçadas, algumas cenas de ação legais, mas fica muito em terreno seguro, não tenta se arriscar a fazer melhor. Provavelmente venha uma quarta película por aí, mas, pela forma como os últimos dois filmes não fizeram jus ao ótimo primeiro, talvez seja a hora de Tony pendurar a armadura.

A Torre Eiffel

Quando voltei de Paris, em 2011, escrevi um texto sobre a cidade (que pode ser lido na íntegra aqui) – e, embora goste muito de todo o texto, tenho um orgulho particular pelo trecho abaixo, que considero um dos mais legais que já escrevi:

Eu odeio escrever coisas clichê. Odeio mesmo. Só que às vezes os clichês são a verdade pura e, nesse caso, a verdade pura é a seguinte: ver a Torre Eiffel ao vivo, cara a cara, tête-à-tête, é das coisas mais emocionantes que já fiz na vida. É uma estrutura monstruosamente grande, imponente, e, ao mesmo tempo, linda. Tipo a primeira vez que a gente vê o mar. Lembro que fiquei um pouco decepcionado ao descobrir que ela havia sido construída para a exposição universal de 1889, e não como monumento a algo ou alguém. Mas, pensando melhor, até que faz sentido: a Torre Eiffel é tão sensacional que só pode existir enquanto ela mesma, sem precisar de histórias ou adendos para elevar sua imagem. Ela é espetacular o suficiente para que sua beleza e história comecem e terminem nos 324 metros de altura que são o rosto da França.

Hipnos

Acredito que a grande característica da vida adulta seja aquela incapacidade de, em algumas noites, deitar na cama para dormir e entrar em um coma induzido pelas próximas dez ou doze horas. Uma habilidade treinada e utilizada à exaustão, mas que se perde em algum ponto de ônibus do itinerário da vida. É, de certa forma, uma perda tão psicológica quanto física: momentos que provaram ser possível duas espécies diferentes coexistirem juntas em plena harmonia – no caso, homem e colchão – já não se repetem mais. O conjunto deixa de existir.
Ando sofrendo com o sono socialista, aquele dividido entre várias partes iguais ao longo da noite, e experiências empíricas comprovaram que ele não funciona na prática (assim como o socialismo, se for parar pra pensar), permitindo à preguiça blitzkriegear cada célula do corpo. Como não bebo café e nem mesmo energético, dependo de uma sedutora latinha de Coca-Cola para manter a produtividade em determinados horários matinais.
Somando as conclusões dos dois parágrafos, temos o perfil de cada adulto do mundo: individualismo e crença nas grandes corporações. Ou seja, o grande problema que faz esse mundo ser tão endemoniado é, basicamente, falta de sono.

Trinta e um filmes

No livro 31 Canções, o escritor Nick Hornby investiga as (obviamente) 31 canções que mais influenciaram sua vida de um jeito ou de outro e escreve sobre elas – não as suas favoritas, não as melhores, apenas 31 canções que, boas ou rins, tiveram importância em algum momento de sua jornada.

Como NICKÃO é um de meus autores favoritos, sendo Febre de Bola uma subestimada enxurrada de insights brilhantes sobre o futebol e a vida, resolvi copiar descaradamente sua ideia, mas puxando para o lado que eu conheço mais – o cinema. Assim, iniciei o projeto 31 Filmes, que, ao longo de um prazo de tempo que eu não determinei e que provavelmente não cumpriria se tivesse determinado algum, farei comentários a respeito dos filmes que foram importantes na minha vida – não necessariamente os melhores ou os meus favoritos, apenas alguns que, bons ou ruins, se destacaram em algum momento da vida.

Portanto, é só acessar aqui e esperar pacientemente que eu me obrigue a escrever cada texto: http://31filmes.tumblr.com/

Breves notas sobre viajar de avião

– Todos os aeroportos possuem, obviamente, pistas de decolagem e pouso. E todas essas pistas de decolagem e pouso possuem enormes faixas de segurança em alguns locais. Não sei dizer exatamente qual é a função delas – acredito que sejam referência para determinadas ações dos pilotos, como, por exemplo, marcar o ponto inicial onde o avião inicia sua corrida desenfreada em busca dos céus. Entretanto, gosto de imaginar uma guriazinha tentando atravessar a pista por ali e sendo impedida por uma mãe que diz “cuidado, filhinha, espera o avião passar antes de atravessar”;
– A percepção de que um avião é um avião só existe fora dele. Quando na parte de dentro, a realidade passa ser menos a de uma aeronave e mais a de um grande tubo asséptico e monocromático, repleto de gente entediada e apressada. Tipo uma repartição pública que voa;
– Dizem que a decolagem e o pouso são os momentos mais perigosos. Pode ser, não sei. Minha única certeza é a de que decolar junto com um avião produz uma das sensações mais esquisitas possíveis, pois, conforme anos de aprendizagem prática da física mecânica ensinaram ao corpo, a decolagem é seguida pela inevitável expectativa de que o avião logo comece a descer (o que acontece em qualquer propulsão cotidiana que nos tire do chão – um pulo, um tropeço, etc). É necessário reconfigurar todo o sistema nervoso (e de crenças) para superar isso, o que muitas vezes leva entre cinco e quinze minutos e frequentemente é externado de alguma forma – no meu caso, por exemplo, são os olhos fechados com força e a repetição constante do mantra “a gravidade é uma ilusão”;
– Viajar de avião, aliás, é uma experiência de desapego completo do controle, visto que nem a ilusão de controle consegue embarcar junto. Um passageiro de avião simplesmente está sujeito a tudo que acontecer, sem poder tomar medidas preventivas e/ou reativas em noventa e cinco por cento das vezes. Seria a oportunidade perfeita para se resignar com o fato de que o mundo todo está além do alcance e relaxar, não fosse o fato de que é impossível relaxar quando se está a quilômetros de altura da zona de conforto;
– Dizer que mais pessoas morrem em acidentes de carro do que em acidentes de avião não me deixa mais tranquilo ao andar de avião, só mais nervoso ao andar de carro;
– As aeromoças possuem um nível profissional tão elevado que conseguem ser extremamente cordiais e frias ao mesmo tempo. Talvez por isso não atinjam aquele status fetichístico que se vê em outras profissões como enfermeiras, cheerleaders, médicas, salva-vidas, tenistas, empregadas, executivas, ginastas, atrizes, escritoras, cantoras, policiais, recepcionistas, protagonistas femininas de jogos de videogame, psicólogas, dançarinas, juízas, bandeirinhas de futebol, gandulas, vendedoras, cientistas, jornalistas, publicitárias (principalmente do setor de atendimento), repórteres, âncoras, artistas, tatuadoras, chefs e prostitutas.