Olha ali o tempo fugindo com o que sobrou dos chocolates.

Talvez a principal métrica da passagem para a vida adulta seja o tempo. Ou melhor, a falta dele, a incapacidade de conseguir organizar e fazer tudo o que se quer organizar e fazer, uma pertinente corrida em direção à parada quando o ônibus recém engatou a primeira marcha e marcha para longe. Entre trabalho, projetos, lazer, momentos significativos com as pessoas que sentem a nossa falta quando não estamos por perto, epopéias desconcertantes em busca de um mínimo sequer que seja só um pouquinho mesmo tá bom de sexo, parece que o relógio está sempre um pouco apressado e um pouco na frente. Fico pensando às vezes se não é o contrário, se não é o tempo que está rodando em FF e nós estamos na velocidade normal.

O próprio ato de postar aqui no blog meio que surge como um lembrete de tomar remédio, e não apenas como uma vontade natural porque essa vontade se divide entre Graça Infinita, Netflix, DVDs, filmes, outros projetos escritísticos, cervejadas, saídas, Xbox, Xvideos, timeline do Twitter enfim, um vistoso e diversificado leque de coisas que poderiam estar sendo feitas mas não estão sendo feitas e estão tipo queimando ônibus e vandalizando caixas automáticos de bancos dentro do cérebro para chamarem a atenção e finalmente serem feitas. Difícil dar a descarga na sensação de que a cada segundo algo está deixando de ser aproveitado (já me disseram que isso é medo da morte. Já me disseram que é falta de organização, também).

Talvez isso seja sintomático de uma época que viaja em pílulas de DDA, onde os próprios portais de notícias não se cansam de colocar manchetes tipo “Cachorro parece estar dançando feliz ao som de Anitta” e “Motorista bêbado capota ônibus e mata vinte e três” lado a lado. Talvez seja questão de saber priorizar as coisas, o que não deve ser fácil, uma vez que a priorização pessoal não é como a priorização corporativa e depende de critérios subjetivos e muitas vezes variáveis e em geral é uma merda do cacete de fazer porque a cabeça fica mudando de ideia o tempo todo, caralho. Talvez seja questão de costume.

De qualquer jeito, é frustrante. Toda hora ganha parece também uma hora perdida. Enquanto escrevo aqui, 600 páginas ficam abandonadas em Graça Infinita. Enquanto leio Graça Infinita, a lista de filmes e séries do Netflix diminui. Enquanto a lista de filmes e séries do Netflix diminui, os templários e os assassinos não se enfrentam no Xbox. Meio que não há para onde fugir. A vida é uma grande festa, repleta de músicas bregas e comida boa e gente cérebrodesligadamente bêbada e sobremesas deliciosas, mas não dá para fazer tudo. Enquanto estamos preocupados enchendo as canecas de chope, o tempo está fugindo com o que sobrou dos chocolates da mesa de doces.